Quartel do 15º Batalhão do Exército, praça Rui Barbosa

O Quartel, que ficava localizado na praça Rui Barbosa, foi amplamente utilizado para a prisão de militantes acusados de serem comunistas. Alguns sofreram torturas físicas, outros, psicológicas.

De acordo com o relato de vários depoentes na Comissão Estadual da Verdade do Paraná, este local foi bastante utilizado durante a Operação Marumbi, sendo muitas vezes a primeira parada dos presos ao chegarem à capital, antes de serem transferidos à Clínica Marumbi.

Tereza Urban, militante paranaense que deu o nome à Comissão da Verdade no Estado, relatou parte de seu suplício neste local. Segundo relatório da comissão[1], “sofreu muito, torturas psicológicas e físicas, inimagináveis, ali na Praça Rui Barbosa, onde então funcionava um quartel militar (hoje, Rua da Cidadania). Era a central curitibana da repressão política”.

Outros casos de tortura nesta mesma localidade são relatados por estudantes presos em dezembro de 1968 em um Congresso na “Chácara do Alemão”. Este evento foi organizado pela UNE, com o objetivo de discutir as medidas unilaterais a respeito da educação superior. As pautas eram a defesa do ensino gratuito e repúdio ao convênio MEC/USAID.  De acordo com o relatório da Comissão, (2014, p. 35)

Os estudantes foram presos pela polícia do Exército e ainda durante seu transporte para o quartel da Polícia Militar foram torturados com espancamentos e ameaças graves. O local da prisão e tortura foi nas instalações da Polícia Militar então localizado na Praça Rui Barbosa na capital. Após as sessões de tortura quinze desses estudantes foram indiciados em inquérito policial militar e foram processados perante a Justiça Militar.

Os relatos de prisões e torturas infligidas por agentes do Estado neste local são bastante volumosos. O perfil de indivíduos presos varia bastante, desde estudantes até trabalhadores comuns. O ponto de convergência entre todos era a acusação de serem “subversivos”.

Durante a Operação Marumbi, este local foi usado para sessões de torturas. Ildeu Manso Vieira relata que soube onde estava somente após várias sessões de tortura, através de um colega: “Um nevoeiro envolveu a prisão e, por intermédio de Siqueira fiquei sabendo que a cela dos horrores estava localizada em um prédio do Exército, na praça Rui Barbosa, bem próximo da minha casa”[2].

João Alberto Einnecke descreve de forma esparsa algumas características do lugar como uma sala ampla, na qual havia mesas distribuídas pelo canto, onde ele presenciava a tortura de várias pessoas.[3] As instalações do imóvel da praça Rui Barbosa foram cedidas à prefeitura de Curitiba no final do ano de 1975 em troca de um terreno no bairro Pinheirinho[4]. O local foi transformado em terminal rodoviário urbano e abriga a Rua da Cidadania Matriz.

Antigo quartel da Praça Rui Barbosa visto do edifício Presidente em 1968. Fonte: Curitiba Antiga. Disponível em: <http://www.curitibaantiga.com/fotos-antigas/615/Quartel-General-e-Pra%C3%A7a-Ruy-Barbosa-Vista-do-Edif%C3%ADcio-Presidente-em-1968.html> acesso em 17 de fevereiro de 2018.

Atual Rua da Cidadania Matriz, onde era localizado o quartel da Praça Rui Barbosa, 2017. Fonte: acervo do autor

Monumento pela Resistência e a Luta Pela Anistia No Paraná, praça Rui Barbosa, 2017. Fonte: acervo do autor.

As figuras acima mostram uma diferença grande na estrutura do antigo quartel para a Rua da Cidadania Matriz. Entretanto, ao analisar o entorno da praça Rui Barbosa, os transeuntes se deparam com o monumento indicado nesta última imagem, elaborado para simbolizar a resistência daqueles que lutaram contra a ditadura. Desta forma, esta localidade representa uma exceção no que concerne à invisibilidade das marcas da ditadura no Estado. A placa em frente ao monumento traz a seguinte inscrição:

Monumento pela Resistência e a Luta Pela Anistia No Paraná. A Praça Rui Barbosa já abrigou instalações da repressão onde homens e mulheres foram presos e torturados em razão de suas convicções políticas, mas também acolheu manifestações populares para reivindicar justiça e lutar por direitos. Neste local homenageamos aqueles que resistiram à opressão da ditadura e protagonizaram a reconquista das liberdades democráticas no Brasil. Pela verdade, memória, reparação e justiça para todos. Para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça. Curitiba, 16 de agosto de 2013.

A despeito de todo o mérito em se construir um monumento em homenagem àqueles que lutaram contra a ditadura e em fazer uma tentativa de se romper o silêncio a respeito destes locais, o estado de conservação da placa e do monumento é preocupante. A placa está parcialmente coberta pela grama e pela sujeira, sendo que para fazer a leitura é necessária uma limpeza prévia. Ademais, por se tratar de uma arte de forma mais abstrata, é difícil imaginar um cidadão interrompendo sua caminhada para achar algum significado na obra. É interessante notar a data da elaboração desta obra, pois o ano de 2013 coincidia com o andamento das Comissões da Verdade, às vésperas dos 50 anos do golpe, quando se investigava os crimes cometidos por militares no exercício do poder ditatorial no Brasil. A presidente da República era Dilma Rousseff, ex-guerrilheira e protagonista na militância (até mesmo armada) contra o regime. Na atual conjuntura em que o país atravessa, no ano de 2018, seria difícil imaginar o avanço na construção de mais monumentos como esse.


[1] Relatório da Comissão Estadual da Verdade Tereza Urban – CEV/PR 2014, p. 06
[2]VIEIRA, Ildeu Manso. Memórias torturadas (e alegres) de um preso político. Curitiba: SEEC, 1991. P. 30
[3]BRUNELO, Leandro. Repressão política durante o regime militar no Paraná: o caso da Operação Marumbi na terra das araucárias. Maringá: EDUEM, 2009., p. 103.
[4]CALCIOLARI, Silvia. Ex-presos políticos e a memória social da tortura no Paraná (1964-1978). Curitiba: Assembleia Legislativa do Paraná, 2006, p. 175.